Críticas | Anatomia de Uma Queda

“Anatomia de Uma Queda” estreou ontem, 25 de janeiro, nos cinemas brasileiros.

Imagem: Reprodução

Situações sociais, daquelas que vemos com facilidade durante a rotina televisionada, podem ser capazes de aflorar as ideias dos profissionais atuantes no mundo cinematográfico. No caso de Anatomia de Uma Queda, a diretora e roteirista francesa Justine Triet destaca-se pela criação de um drama de tribunal que prende a atenção do espectador do início ao fim. Sua maior habilidade reside no desenvolvimento de uma atmosfera que tem como propósito revelar a “verdade” em forma de camadas.

A trama intrigante segue Sandra (Sandra Hüller), uma escritora alemã que está passando por um processo de investigação após a morte do marido. Encontrado em frente a casa já sem vida por Daniel (Milo Machado Graner), o filho do casal, é certo que o corpo sofreu uma queda brusca do sótão até o chão, pois apresenta ferimentos graves na cabeça e ao redor da pele. As alegações iniciais de Sandra apontam para um suposto suicídio, mas, conforme o cotidiano da família vem à tona, a ficção e a realidade se entrelaçam, levando-nos a questionar os dilemas morais da protagonista.

Sendo uma história com enredo modesto, que não apresenta diversidade de ambientes ou quantidade significativa de papéis centrais, é necessário que, para chamar atenção, o elenco cative a audiência rapidamente. Para Sandra Hüller isso não é um problema, já que sua personagem transita emocionalmente de maneira impressionante. Desde o momento onde os fatos ainda são vagos até quando já estamos habituados com as atitudes e falas controversas da personagem, ela dá um show de atuação. O mesmo pode ser dito de Swann Arlaud, que interpreta Vincent, o advogado da família. Ambos formam uma dupla que se sustenta com base na relação profissional e na amizade que se formou com o passar dos anos. Tanto perante a corte quanto longe dela, Vincent é uma das pessoas que mantém Sandra centrada no objetivo de ganhar o processo, balanceando a narrativa que, à essa altura, analisa milimetricamente a intimidade do casal julgado.

A atuação de Milo Machado Graner é outro ponto que surpreende a cada vez que a câmera recai sobre ele. Ao interpretar Daniel, o filho do casal, que é deficiente visual e depende da assistência de um cão guia para realizar suas atividades, a habilidade auditiva do garoto se torna um dos elementos fundamentais na evolução da trama. A tristeza após a perda do pai, assim como a pressão estabelecida pela corte para dizer o que sabe, afetam o seu psicológico. São muitas responsabilidades para uma criança carregar, sem contar os fatos que ele acaba descobrindo através da mãe na corte. As camadas de humanidade nele expostas revelam não apenas um retrato de inocência infantil, mas também a exploração das nuances emocionais enfrentadas por uma criança no meio de circunstâncias tão aborrecedoras. Seu relacionamento com o cachorro Snoop e a última cena no tribunal falam por si só.

Aclamado pela crítica, o longa-metragem já recebeu diversos prêmios em 2023 e 2024, contando com a Palma de Ouro, o Globo de Ouro de Melhor Roteiro de Cinema e o Critic’s Choice de Melhor Filme Estrangeiro. Justine Triet já provou anteriormente sua capacidade atrás das câmeras ao ser indicada a Palma de Ouro em 2019 por Sibyl, filme que explora a relação conturbada de uma psicoterapeuta com o álcool e com uma paciente em potencial. Retornar às telas trazendo mais da humanidade crua de seus personagens, principalmente das femininas, é um desafio que ela consegue facilmente cumprir, gerando certa excitação para suas próximas produções.

Anatomia de Uma Queda estreou em 25 de janeiro nos cinemas brasileiros.

Nota:

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