Crítica | Ataque dos Cães
Faroeste de Jane Campion estuda a maior figura dos filmes do gênero: o macho.
Segundo o crítico e cineasta brasileiro Arthur Tuoto, um gênero de filmes morre quando todos os novos filmes desse gênero são uma espécie de comentário sobre o mesmo.
Em 2021, Annette, de Leos Carax, e Ataque dos Cães, de Jane Campion são dois exemplos de filmes que fazem parte dos “gêneros mortos” e que propuseram descontruir os pilares famosos de cada um. O primeiro, um musical sem grandes performances de canto e dança. O segundo, um faroeste que estuda a masculinidade do cowboy durão e o que o transformou nisso.
Com o passar dos anos e décadas, o mundo deixou de achar figuras como John Wayne alguém admirável. Passamos a nos incomodar com machismo, misoginia e homofobia em tela e aos poucos até vilões deixaram de ser preconceituosos.
Jane Campion explora esse desconforto com Phil, vivido por Benedict Cumberbatch na atuação de sua vida até agora. Ele é desagradável e tem plena consciência disso, fazendo com que nosso incômodo com ele cresça a cada cena, cada vez de um modo diferente. Dos passos ao canto, das provocações até as piadas. Ele é desagradável e intimidador.
Do outro lado tem Peter (Kodi Smit-McPhee), que representa tudo que Phil detesta e que torna a dinâmica do longa tão interessante.
Os movimentos desajeitados e sua reclusão enganam e com o tempo ele vai se desdobrando, revelando camadas e aos poucos tomando o filme para ele.
Nas laterais do embate dos dois tem Rose (Kirsten Dunst) na jornada mais depressiva do filme. O desenvolvimento dela é o que mais dá sentido ao título do filme (o original porque a tradução ficou horrorosa).
Jesse Plemons faz George, irmão de Phil e para mim o elo fraco do filme. Gostei do personagem, gostei da atuação mas não gostei do jeito que ele some do filme, ainda mais por ele ser o elo que junta todos os outros personagens. Esperava um uso melhor dele.
O incansável Jhonny Greenwood, guitarrista do Radiohead e parceiro de longa data de Paul Thomas Anderson assina a maravilhosa trilha sonora (a terceira dele no ano junto com Licorice Pizza e Spencer) que remete aos faroestes convencionais mas que não cai em clichês fáceis.
É difícil escrever sobre Ataque dos Cães porquê é um filme que mais mostra do que fala, e falar o mínimo sobre a trama ou os personagens pode estragar a surpresa de quem ainda não assistiu.
Jane Campion sabe como começar, desenvolver e terminar o filme onde ele precisa, sem explicar verbalmente o desfecho (o que gerou vários vídeos desnecessários no YouTube “explicando” o final) e fazendo um faroeste inesperado e maravilhoso.
Ataque dos Cãe está disponível pela Netflix.
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